Do all-in-one às medalhas: o que Jéssica Corrêa e Hélder Neves revelam sobre a cena lusitana — comunidade, concursos, estilos e viabilidade econômica
Introdução: quem fala e por quê
Neste episódio do Brassagem Forte, Henrique Boaventura entrevista Jéssica Corrêa, biotecnóloga e especialista em fermentações, e Hélder Neves, homebrewer desde 2009. O foco: cerveja caseira em Portugal. Um panorama sobre a cena lusitana, de equipamentos, insumos, custos a tendências.
Confira esse papo instigante, que conta com a parceria da Hops Company, da Levteck e da Cerveja Stannis.
Equipamentos e volumes: o padrão português
- Setup mais comum: panela elétrica all-in-one (tipo Grainfather/Kegland).
- Volumes: lotes de 20–25 L são frequentes.
- Envase: kegging (barris/post-mix) reduz tempo e oxidação; garrafa segue útil para lotes com Brett/lactobacilos (evita contaminar linhas/barris limpos).
Comunidade e encontros: cidades, frequência e dinâmica
- Núcleos em Lisboa, Porto, Braga, Coimbra e sinais no Alentejo — crescimento consistente desde mais ou menos 2019.
- Grupos de 40–50 pessoas, com 10–15 muito ativas.
- Encontros mensais em bares de cerveja artesanal; em Lisboa, o LX Homebrewers se reúne na Flor de Lúpulo. Cada participante leva amostras, define-se ordem de prova e rolam feedbacks técnicos.
Colaboração com cervejarias e festivais
Cervejarias artesanais abrem a fábrica para braçagens coletivas, organizam talks e convidam grupos para demonstrações ao vivo em festivais — um ciclo virtuoso: mais aprendizado, mais consumo consciente e atração de novos homebrewers.
Insumos e logística: maltarias, leveduras e peças
- Lojas físicas em Lisboa cobrem o básico; peças específicas vêm de e-commerce da Espanha/Bélgica.
- Maltes: The Swaen, Weyermann, BestMalz, Simpsons (ampla oferta europeia).
- Leveduras: predomínio de secas no dia a dia (Fermentis, Mangrove Jack’s, Lallemand); White Labs (líquida) aparece com menor frequência.
Custos e viabilidade: quão dispendioso é produzir
No cenário relatado, produzir 25 L/mês pode resultar em ~€ 2,00 por garrafa de 330 ml (referência de Jéssica Corrêa), valor competitivo frente ao consumo fora de casa. Kegging ainda corta custo de embalagem e economiza tempo.
Concursos e BJCP: CNCCA e novo campeonato
- CNCCA (Concurso Nacional de Cerveja Caseira e Artesanal): ~12 anos, com trilhas homebrewer e profissional (julgamentos separados, premiação conjunta); ~70 amostras na trilha caseira.
- Novo torneio: campeonatohomebrewers.pt, aberto a todo o país, buscando inscritos e juízes.
- BJCP: ainda há poucos juízes ativos; mesas tendem a ter ao menos um BJCP acompanhado de avaliadores experientes.
Mercado craft e disponibilidade: onde comprar e beber
Lisboa/Porto concentram bares com chope e lojas (muitas permitem consumo no local). No interior, a oferta é mais escassa — há casos em que a loja mais próxima fica a cerca de 100 km!
Estilos em alta e tendências
- IPA/Hazy IPA seguem fortes, acompanhando o movimento global.
- Rice lagers apareceram com frequência em festivais (alta drinkability, baixo ABV).
- Smoothie sours cresceram no último ano — polêmicas por textura/cor.
- Catarina Sour surge pontualmente, sobretudo em projetos de brasileiros, reforçando a ponte Brasil-Portugal.
Outras fermentações: além da cerveja
A cena caseira também abraça hidromel, tepache e sidra — sinal de curiosidade e amplitude fermentativa.
Aprendizado e conteúdo: Portugal x exterior
A troca é majoritariamente presencial. Nos canais digitais, há legado do fórum Cervejas do Mundo (hoje no Facebook) e o podcast Quem Bebe por Gosto (divulgação). Para processo técnico, muitos buscam EUA/Reino Unido/Brasil (ex.: Cerveja Fácil).
Existe aí uma oportunidade para se criar mais conteúdo didático local.
Perspectivas e próximos passos
Com cadeia de insumos europeia, clubes ativos e ponte com o mercado profissional, o homebrewing em Portugal tende a crescer.
Entre as prioridades, destacam-se: formação de juízes BJCP, mais concursos e educação técnica local para sustentar qualidade e inovação (de German Pils precisas a sours com Brettanomyces).
Como participar:
- LX Homebrewers (Lisboa) — Instagram: @lxhomebrewers; encontros mensais na Flor de Lúpulo.
- Campeonato: campeonatohomebrewers.pt — inscrições para homebrewers e juízes.
Conclusão
Portugal vive a fase de consolidação e expansão da cerveja caseira: equipamentos all-in-one, custos viáveis, comunidade acolhedora e trânsito com profissionais.
Para quem chega agora, o caminho é claro: apareça nos encontros, compartilhe suas brassagens, peça feedbacks — e brasse de novo.