#294 – Acid Shock em Cervejas Ácidas Complexas: guia completo de refermentação e adaptação de levedura

Neste episódio do Brassagem Forte, Henrique Boaventura recebe Diego Simão para um novo e instigante papo sobre cervejas ácidas complexas, mais especificamente sobre o procedimento conhecido como Acid Shock.

É mais um capítulo que conta com a parceria da Hops Company, da Levteck e da Cerveja Stannis.

Por que “Acid Shock” é necessário nas cervejas ácidas complexas

O Acid Shock, ou choque ácido, é um protocolo fundamental para quem produz cervejas ácidas complexas. Diferente das ales ou lagers, o ambiente final da garrafa é extremamente hostil para a levedura: pH baixo (3,0–3,5), alta concentração de ácidos orgânicos, escassez de nutrientes e teor alcoólico elevado.

Sem adaptação, a refermentação em garrafa falha, gerando off-flavors como diacetil, acetaldeído e até risco de cerveja instável.

Cervejas rápidas x cervejas complexas

Em kettle sours e ácidas rápidas, o pH é baixo, mas ainda há nutrientes no mosto. Nesses casos, a levedura consegue se adaptar dentro do próprio fermentador. Já nas complexas, após longos períodos de maturação, os nutrientes se esgotam e a levedura não consegue se reproduzir. É aí que o Acid Shock se torna indispensável.

O princípio da solução

O método consiste em adaptar a levedura em etapas, misturando progressivamente a cerveja a ser envasada com um meio nutritivo. Assim, as células se acostumam ao pH ácido, à presença de ácidos e ao teor alcoólico, garantindo uma refermentação em garrafa estável e vigorosa.

Levedura ideal e nutrientes

A recomendação é usar leveduras robustas, especialmente cepas de espumante (Saccharomyces eubayanus) ou cepas comerciais de alta tolerância alcoólica.
Além disso, é essencial incluir nutrientes de refermentação — de preferência os usados em vinhos espumantes — no priming, para evitar fermentações incompletas e defeitos sensoriais.

Materiais necessários

  • Mosto estéril ou suco de maçã integral sem conservantes (OG ~1.036–1.042).
  • A própria cerveja que será envasada.
  • Recipiente sanitizado com airlock.
  • Agitador magnético (opcional).
  • Nutriente específico.
  • Levedura fresca de refermentação.

Planeje-se: comece o processo uma semana antes do envase.

Protocolo de Acid Shock em 3 dias

Dia 1 – Ativação

Inocule a levedura no suco de maçã ou mosto estéril e deixe 24 h.

Dia 2 – 1º Choque

Misture 75% meio nutritivo + 25% cerveja. Fermente por mais 24 h.

Dia 3 – 2º Choque

Misture 50% meio nutritivo + 50% cerveja. Após mais 24 h, você já terá uma massa celular adaptada.
Para grandes volumes (100 L+), pode-se fazer um 3º choque (75% cerveja + 25% meio).

O envase: priming, nutriente e ordem correta

  1. Faça a calda de priming com açúcar + nutriente (fervida para sanitização).
  2. Transfira a cerveja para o balde de envase junto à calda.
  3. Adicione a levedura adaptada somente depois da calda ter esfriado.
  4. Homogeneíze tudo, evitando excesso de oxigênio.

O processo garante carbonatação estável, evita oxidação (THP) e reduz riscos de diacetil e acetaldeído.

Erros comuns a evitar

  • Esquecer o nutriente.
  • Jogar a levedura em calda quente.
  • Fazer priming garrafa a garrafa.
  • Usar levedura inadequada (ex.: ale de prateleira).
  • Apostar apenas em carbonatação forçada, que aumenta risco de oxidação.

Maturação e expectativas

Após o envase, espere pelo menos 15 a 30 dias para garantir estabilidade. Em alguns casos, a maturação pode levar até 3 meses antes de a cerveja estar pronta para consumo ou comercialização.

Conclusão

O Acid Shock é um processo simples, mas crucial, para garantir que cervejas ácidas complexas cheguem à garrafa com estabilidade, carbonatação adequada e sem off-flavors. Com levedura robusta, nutriente certo e protocolo de adaptação, você transforma anos de trabalho em uma cerveja que entrega o que se espera: complexidade, equilíbrio e qualidade sensorial!

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