Se você quer saber como se avalia uma cerveja artesanal de forma técnica, este conteúdo é para você! Neste episódio especial do Brassagem Forte, Henrique Boaventura e Gabriela Lando, a Química Cervejeira, realizam a primeira edição do Dia do Julgamento, avaliando, segundo os critérios do BJCP, uma Blonde Ale caseira enviada pelo Taylor, membro da Cerva Serra – Cervejeiros da Serra Gaúcha.
Com a parceria da Lamas Brewshop, da Hops Company, da Levteck e da Cerveja Stannis, acompanhe a avaliação completa da Blonde Ale, entenda os pontos fortes, os erros, os acertos e, principalmente, descubra como melhorar suas próprias brassagens.
O estilo Blonde Ale
A Blonde Ale é uma cerveja de origem americana, de alta fermentação, leve e com alta drinkabilidade. Seu perfil sensorial é limpo, maltado, com baixo amargor e sutis notas de lúpulo floral, frutado ou herbal. Apresenta corpo médio-baixo, final seco e não deve ter sabores agressivos.
Ideal para quem quer uma cerveja fácil de beber, mas sem abrir mão de equilíbrio e qualidade sensorial.
Ficha Técnica da Produção
- Estilo: Blonde Ale (BJCP 18A)
- Malte: 100% Pilsen (Agrária)
- Lúpulo: Brewers Gold (fresco, colhido no dia)
- Levedura: Safale US-05 (3ª geração)
- Água: Água de poço, sem análise prévia
- Adições de lúpulo:
- 100g na fervura (60 min.)
- 100g no whirlpool (flameout)
A cerveja foi produzida no CEAB (Centro Estadual de Diagnóstico e Pesquisa em Alimentos e Bebidas) em Caxias do Sul, utilizando lúpulo fresco cultivado localmente, sem análises laboratoriais sobre alfácidos ou perfil da água.
Análise sensorial completa da Blonde Ale
Aroma
- Percepções:
- Malte de baixa intensidade (pão, biscoito, cereal)
- Leve dulçor (caramelo e mel), sugerindo início de oxidação
- Lúpulo floral e frutado (pêssego, maçã) em baixa intensidade
- Esterificação perceptível, gerando notas de frutas amarelas e cítricas
- Problemas: Aroma não completamente limpo, leve oxidação
- Nota: 7/12
Aparência
- Percepções:
- Cor amarelo palha a dourado claro
- Límpida, porém não cristalina (leve turbidez)
- Espuma branca, densa, de ótima formação e retenção, com aspecto cremoso
- Nota: 3/3
Sabor
- Percepções:
- Malte presente (pão, biscoito, cereal) com leve dulçor
- Lúpulo floral e herbal em baixa intensidade
- Frutado lembrando drupas (pêssego, damasco)
- Amargor baixo, final seco
- Leve acidez acompanhada de notas de oxidação (caramelo e mel)
- Nota: 11/20
Sensação na boca
- Percepções:
- Corpo médio-baixo a baixo
- Carbonatação média-alta, conferindo vivacidade
- Sem adstringência, sem aquecimento alcoólico
- Secura perceptível, o que impacta na cremosidade e na maciez
- Notas:
- Gabriela: 4/5 (descontou pela falta de cremosidade)
- Henrique: 5/5
Impressão geral
- Conclusão:
Cerveja honesta, dentro do estilo, mas afetada por problemas técnicos como leve oxidação e acidez inesperada. A secura excessiva reduz um pouco a drinkabilidade. - Sugestões:
- Analisar e ajustar o perfil da água (evitar uso de água não tratada)
- Minimizar exposição ao oxigênio após fermentação e no envase
- Melhorar relação malte/água para aumentar o corpo
- Revisar o uso de lúpulo fresco e sua influência no perfil sensorial
- Notas:
- Gabriela: 6/10
- Henrique: 6/10
Pontuação Final
- Gabriela: 30 pontos
- Henrique: 32 pontos
→ Classificação BJCP: Muito boa – dentro do estilo, mas com algumas falhas perceptíveis.
Bastidores da produção: desafios e aprendizados
- A cerveja foi feita em um evento coletivo, com uso de lúpulo fresco da plantação experimental do CEAB.
- A água utilizada era de poço, sem análise, ajustada empiricamente com ácido lático na brassagem.
- Levedura Safale US-05 em terceira geração, sem cultivo prévio, o que pode ter contribuído para a esterificação excessiva.
- O lúpulo Brewers Gold foi colhido no dia, sem parâmetros precisos de alfácido, o que dificultou o controle do amargor.
- A leve acidez pode ter origem na acidificação mal calculada da água ou em fermentação com micro-organismos indesejados.
Considerações finais dos juízes:
Apesar dos desafios, a cerveja ficou boa, bebível e dentro do estilo. O feedback técnico permite que Taylor melhore sua próxima brassagem, especialmente nos controles de água, fermentação e oxigênio.
Conclusão: como avaliar cervejas e evoluir como cervejeiro caseiro
O Dia do Julgamento não se pretende como mero exercício de análise de amostras. É uma aula sobre como avaliar cerveja artesanal, entender seus defeitos e acertos, e usar o feedback como ferramenta de evolução.
Taylor, com quase 10 anos de experiência como cervejeiro caseiro, mostra que, mesmo depois de muita prática, cada brassagem traz novos aprendizados — especialmente quando lidamos com variáveis pouco controladas como água desconhecida ou lúpulo fresco.
✅ O aprendizado aqui vale para qualquer cervejeiro caseiro: controle rigoroso da água, da fermentação e da oxidação são fundamentais para transformar uma boa cerveja em uma excelente cerveja.